quinta-feira, julho 5

Realidade x Ficção: O que a Ciência tem a dizer sobre Jurassic Park?



Aproveitando o sucesso de bilheteria de Jurassic World: Reino Ameaçado, que levou quase 925 mil espectadores aos cinemas brasileiros, nossa equipe conversou com dois paleontólogos do Museu de Ciências da Terra (MCTer) para descobrir quais são as diferenças e semelhanças entre os dinossauros representados na tela grande e aqueles que dominaram a Terra há 65 milhões de anos.

Começando pela polêmica envolvendo o astro principal dos filmes de Jurassic Park, a ausência de penas do Tiranossauro Rex. Já há estudos que indicam que essa espécie apresentava resquícios de penugem, principalmente no crânio e que suas características estavam mais próximas às das aves que conhecemos hoje, que possuem boa visão e ótimos sentidos de olfato e audição. “Você provavelmente seria devorado caso ficasse imóvel na frente dele”, conta Rodrigo Machado, paleontólogo do Museu de Ciências da Terra.

Muitos dos dinossauros retratados no filme viveram no Cretáceo, o mais recente período da Era Mesozóica – entre 145 e 65 milhões de anos atrás, então por que não o título “Cretaceous Park”? Para o pesquisador, a justificativa talvez se dê pelo nome ser mais difícil de pronunciar do que “Jurassic Park”. Cabe ressaltar também que, tecnicamente, não seria correto usar Cretaceous, pois no filme também encontramos algumas espécies do jurássico. Machado brinca que no final das contas o título deveria ser “Holocene Park”, porque a história se passa nos dias atuais, época chamada de Holoceno.

Os dinossauros despertam interesse nas pessoas desde que foram descobertos e nomeados, em meados do século XIX. Outros fósseis de animais gigantes, como mamutes e mastodontes, já eram conhecidos, mas enquanto estes eram claramente parecidos com os elefantes, os dinossauros eram diferentes de qualquer outro ser vivo já encontrado. “Na época, a ideia de que grupos inteiros de seres vivos podiam ser extintos ainda era controversa. Mais tarde, com a descoberta de esqueletos mais completos, suas montagens se tornaram grandes atrações dos já então populares museus de história natural”, explica Rafael Silva, paleontólogo do MCTer.

Até a década de 1970, os estudos científicos classificavam os dinossauros como animais de “sangue frio”, lentos e reptilianos. Essa visão passou a ser questionada por novas evidências paleontológicas, resultando numa verdadeira revolução na ciência, o que inspirou o escritor Michael Crichton a criar seu famoso romance Jurassic Park, publicado em 1990. Segundo Rafael, Crichton de fato teve a consultoria de paleontólogos para redigir o livro. “Somado a isso, o primeiro filme (1993) gerou uma das maiores inovações da história do cinema, com a animação dos dinossauros sendo substituída pela computação gráfica, com resultados até hoje surpreendentes”.

Porém, o pesquisador adverte que os filmes da franquia Jurassic Park podem causar certa confusão nos espectadores, que talvez acreditem que todos os animais ali representados são dinossauros. “Na verdade, os pterossauros e os mosassauros, por exemplo, não são enquadrados nessa categoria. Os pterossauros representam um grupo à parte com ancestrais em comum com os dinossauros, enquanto que os mosassauros são na verdade lagartos marinhos gigantes, parentes do Dragão-de-Komodo e do Lagarto-Monitor”, conta Silva.

Os pterossauros não eram dinossauros, mas compartilhavam com estes o mesmo ancestral comum. (Fonte: Reprodução)
Os mosassauros eram lagartos marinhos gigantes e foram os principais predadores dos oceanos no final do período Cretáceo (Fonte: Reprodução)


Os filmes de Jurassic Park influenciaram gerações de paleontólogos. Houve um impacto positivo no sentindo de estimular a curiosidade das pessoas, que passaram a procurar saber mais sobre o assunto. “Ao mesmo tempo, cresceu o investimento e valorização nas pesquisas envolvendo dinossauros, com uma maior disponibilidade de financiamento de projetos e procura por cursos de pós-graduação”, comenta Rafael.

Por outro lado, há também os impactos negativos, especialmente como a mídia retrata esses seres, de forma frequentemente equivocada ou sem embasamento científico. Silva lembra que quando o livro Jurassic Park foi publicado por Michael Crichton, ele incorporava as mais recentes descobertas científicas, como a relação filogenética dos dinossauros com as aves (que, a rigor, são de fato dinossauros) e o “sangue quente” desses animais (capacidade de gerar e controlar sua temperatura corporal).

Segundo Rafael, o primeiro filme foi inspirado profundamente nesse livro, com algumas modificações na trama, mas a visão dos dinossauros era essencialmente a mesma. As sequências mantiveram o conceito de dinossauros, mas não refletiram os novos avanços da ciência nas telas de cinema, como o fato de muitas espécies terem o corpo recoberto por penas. “Talvez os grandes estúdios achassem que um Tiranossauro emplumado não fosse tão assustador”, brinca o paleontólogo.

Mas e os dinossauros brasileiros? Será que é possível relacioná-los aos que aparecem nas obras cinematográficas? “Em nosso país, existem fósseis de espécies que pertencem à mesma família que o Spinosaurus (aquele grandão com uma vela nas costas que enfrenta e vence o Tyrannosaurus no último filme da trilogia original). Então, pode-se dizer que este dinossauro, ou algo parecido com ele, realmente habitou nosso território”, explica.

Silva acredita que, aparentemente, nenhuma outra espécie brasileira pode ser identificada nos filmes porque alguns animais estão tão exagerados, distorcidos ou reinventados, que fica difícil reconhecer em quais espécies foram baseados. “Eu ainda não assisti ao último filme (Jurassic World: Reino Ameaçado), mas pude observar no trailer que o Carnotaurus, do Cretáceo da Argentina, está presente, da mesma forma como no livro de Michael Crichton, O Mundo Perdido, o que pode ser interpretado como outra contribuição da América do Sul ao universo cinematográfico sobre dinossauros mais famoso de todos os tempos”, diz o pesquisador.

Texto: Jaques Lucas Cavalcanti
Revisão: Cibele Pixinine
Supervisão: Warley Pereira