Aproveitando
o sucesso de bilheteria de Jurassic
World: Reino Ameaçado, que levou quase 925 mil espectadores aos cinemas
brasileiros, nossa equipe conversou com dois paleontólogos do Museu de Ciências
da Terra (MCTer) para descobrir quais são as diferenças e semelhanças entre os
dinossauros representados na tela grande e aqueles que dominaram a Terra há 65 milhões de anos.
Começando pela polêmica envolvendo o astro principal dos
filmes de Jurassic Park, a ausência
de penas do Tiranossauro Rex. Já há estudos que indicam que essa espécie
apresentava resquícios de penugem, principalmente no crânio e que suas
características estavam mais próximas às das aves que conhecemos hoje, que
possuem boa visão e ótimos sentidos de olfato e audição. “Você provavelmente
seria devorado caso ficasse imóvel na frente dele”, conta Rodrigo Machado,
paleontólogo do Museu de Ciências da Terra.
Muitos
dos dinossauros retratados no filme viveram no Cretáceo, o mais recente período
da Era Mesozóica – entre 145 e 65 milhões de anos atrás, então por que não o título
“Cretaceous Park”? Para o pesquisador, a justificativa talvez se dê pelo nome
ser mais difícil de pronunciar do que “Jurassic Park”. Cabe ressaltar também
que, tecnicamente, não seria correto usar Cretaceous, pois no filme também
encontramos algumas espécies do jurássico. Machado brinca que no final das
contas o título deveria ser “Holocene Park”, porque a história se passa nos
dias atuais, época chamada de Holoceno.
Os
dinossauros despertam interesse nas pessoas desde que foram descobertos e
nomeados, em meados do século XIX. Outros fósseis de animais gigantes, como
mamutes e mastodontes, já eram conhecidos, mas enquanto estes eram claramente
parecidos com os elefantes, os dinossauros eram diferentes de qualquer outro
ser vivo já encontrado. “Na época, a ideia de que grupos inteiros de seres
vivos podiam ser extintos ainda era controversa. Mais tarde, com a descoberta
de esqueletos mais completos, suas montagens se tornaram grandes atrações dos
já então populares museus de história natural”, explica Rafael Silva,
paleontólogo do MCTer.
Até a
década de 1970, os estudos científicos classificavam os dinossauros como
animais de “sangue frio”, lentos e reptilianos. Essa visão passou a ser
questionada por novas evidências paleontológicas, resultando numa verdadeira
revolução na ciência, o que inspirou o escritor Michael Crichton a criar seu
famoso romance Jurassic Park, publicado
em 1990. Segundo Rafael, Crichton de
fato teve a consultoria de paleontólogos para redigir o livro. “Somado a isso,
o primeiro filme (1993) gerou uma das maiores inovações da história do cinema,
com a animação dos dinossauros sendo substituída pela computação gráfica, com
resultados até hoje surpreendentes”.
Porém, o
pesquisador adverte que os filmes da franquia Jurassic Park podem causar certa confusão nos espectadores, que
talvez acreditem que todos os animais ali representados são dinossauros. “Na
verdade, os pterossauros e os mosassauros, por exemplo, não são enquadrados
nessa categoria. Os pterossauros representam um grupo à parte com ancestrais em
comum com os dinossauros, enquanto que os mosassauros são na verdade lagartos marinhos gigantes, parentes do
Dragão-de-Komodo e do Lagarto-Monitor”, conta Silva.
Os pterossauros não eram dinossauros, mas compartilhavam com estes o mesmo ancestral comum. (Fonte: Reprodução) |
Os mosassauros eram lagartos marinhos gigantes e foram os principais predadores dos oceanos no final do período Cretáceo (Fonte: Reprodução) |
Os filmes de Jurassic
Park influenciaram gerações de paleontólogos. Houve um impacto positivo no
sentindo de estimular a curiosidade das pessoas, que passaram a procurar saber
mais sobre o assunto. “Ao mesmo tempo, cresceu o investimento e valorização nas
pesquisas envolvendo dinossauros, com uma maior disponibilidade de
financiamento de projetos e procura por cursos de pós-graduação”, comenta
Rafael.
Por outro lado, há também os impactos negativos,
especialmente como a mídia retrata esses seres, de forma frequentemente equivocada
ou sem embasamento científico. Silva lembra que quando o livro Jurassic Park foi publicado por Michael
Crichton, ele incorporava as mais recentes descobertas científicas, como a
relação filogenética dos dinossauros com as aves (que, a rigor, são de fato
dinossauros) e o “sangue quente” desses animais (capacidade de gerar e
controlar sua temperatura corporal).
Segundo Rafael, o primeiro filme foi inspirado profundamente
nesse livro, com algumas modificações na trama, mas a visão dos dinossauros era
essencialmente a mesma. As sequências mantiveram o conceito de dinossauros, mas
não refletiram os novos avanços da ciência nas telas de cinema, como o fato de
muitas espécies terem o corpo recoberto por penas. “Talvez os grandes estúdios
achassem que um Tiranossauro emplumado não fosse tão assustador”, brinca o
paleontólogo.
Mas e os dinossauros brasileiros? Será que é
possível relacioná-los aos que aparecem nas obras cinematográficas? “Em nosso
país, existem fósseis de espécies que pertencem à mesma família que o Spinosaurus (aquele grandão com uma vela
nas costas que enfrenta e vence o Tyrannosaurus
no último filme da trilogia original). Então, pode-se dizer que este
dinossauro, ou algo parecido com ele, realmente habitou nosso território”,
explica.
Silva acredita que, aparentemente, nenhuma
outra espécie brasileira pode ser identificada nos filmes porque alguns animais
estão tão exagerados, distorcidos ou reinventados, que fica difícil reconhecer
em quais espécies foram baseados. “Eu ainda não assisti ao último filme (Jurassic World: Reino Ameaçado), mas
pude observar no trailer que o Carnotaurus,
do Cretáceo da Argentina, está presente, da mesma forma como no livro de
Michael Crichton, O Mundo Perdido, o
que pode ser interpretado como outra contribuição da América do Sul ao universo
cinematográfico sobre dinossauros mais famoso de todos os tempos”, diz o
pesquisador.
Texto: Jaques Lucas Cavalcanti