No dia 07 de novembro passado, faleceu
o geólogo Augusto José de Cerqueira Lima Pedreira da Silva. Poucos o conheciam
por esse longo e pomposo nome. Para a maioria de nós, colegas e amigos, ele era
simplesmente chamado de Augusto Pedreira ou, mais intimamente de Gugu.
Difícil essa tarefa de resumir em um
texto tão curto a vida profissional e pessoal de Gugu. Que palavras-chave
usaríamos para descrevê-lo? Baiano de Santo Amaro da Purificação, pai amoroso,
esposo apaixonado e avô extremado, amigo, colega leal, professor generoso,
homem honesto, ético, sábio, destituído de vaidade fútil, tímido, talentoso, um
geocientista apaixonadíssimo pela Geologia, exímio (grande) desenhista e
chargista, humorista com um senso de humor afiadíssimo e refinadíssimo... e por
ai vai. Gugu foi tudo isso e muito mais.
Sua vida profissional como geólogo teve
início em 1966, quando graduou-se em Geologia pela Universidade Federal da
Bahia. Em 1971, na condição de bolsista da Organização dos Estados Americanos,
especializou-se em Fotointerpretação Aplicada à Geologia no Centro
Interamericano de Fotointerpretación (Colômbia), sob a orientação do Prof.
Bastiaan Koopmans. Em 1994, tornou-se Doutor em Geociências (área de
concentração Geoquímica e Geotectônica) pela Universidade de São Paulo, USP, com
a tese Supergrupo Espinhaço na Chapada Diamantina Centro-oriental, Bahia:
Sedimentologia, Estratigrafia e Tectônica, orientada pelo Prof. Benjamim
Bley de Brito Neves.
Augusto atuou como geólogo da Empresa
Técnica Comercial e Industrial de Minérios Ltda- TECMINAS, da Comissão
Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira-CEPLAC e do Departamento Nacional de
Produção Mineral- DNPM. Entretanto, foi na CPRM (Serviço Geológico do Brasil)
que ele desenvolveu sua prodigiosa carreira profissional, no período de 1972 a
2011.
Nesses 39 anos de CPRM, Augusto (Gugu)
esteve envolvido em múltiplas áreas de conhecimento, com ênfase para os temas
Geologia Regional, Estratigrafia, Sedimentação Precambriana, Geotectônica e, em
especial, a Geologia da Chapada Diamantina e da Bacia do Rio Pardo. Também
colaborou intensamente no estudo da Bacia do Salitre (Bambuí) e nas bacias
fanerozóicas do Parnaíba, Parecís e Iguatu.
Desenvolveu nesse tempo, atividades de
mapeamento geológico, coordenação e supervisão de projetos, coordenação
executiva de Levantamentos Geológicos Básicos, com ênfase à geologia das
bacias, inúmeros e variados programas de treinamento de pessoal, com ênfase nas
áreas de fotogrametria e fotointerpretação, cartografia geológica, sistemas
deposicionais e estratigrafia.
Como chefe do Projeto Bahia foi
pioneiro, juntamente com Juracy Mascarenhas, na caracterização dos
primeiros greenstone belts brasileiros (e sul-americanos), durante a
elaboração do relatório final do projeto. Como Coordenador Nacional de Sedimentologia
dos Levantamentos Geológicos Básicos do Brasil, foi o principal responsável
pela padronização da nomenclatura de rochas sedimentares e dos termos usados
para catalogação dos ambientes e sistemas deposicionais, no Banco de Dados
Corporativo da CPRM (GEOBANK)
Não demorou muito para que o pessoal da
academia o convidasse a contribuir com seu talento e capacidade na área de
ensino e pesquisa. Dessa forma, atuou entre 2005 e 2009, como professor no
Instituto de Geociências da UFBA, ministrando as disciplinas Geologia Física e
Topografia e Desenho Geológico. De 2009 até o seu falecimento, esteve vinculado
ao Centro de Geologia da Universidade do Porto/Uminho, Portugal, na condição de
pesquisador colaborador. Além disso, foi orientador de trabalhos de conclusão
de curso (TCC) e participou de dezenas de bancas de mestrado, de doutorado, de
qualificação de doutorado e de TCC.
Ultimamente, após sua aposentadoria da
CPRM em 2011, vinha exercendo a função de Gerente de Publicações da Companhia
Baiana de Pesquisa Mineral-CBPM. Diante de uma carreira tão densa e tão
brilhante, a comunidade geocientífica, em reconhecimento à valiosa contribuição
prestada por Augusto Pedreira à evolução do conhecimento da geologia da Bahia,
do Brasil e, em especial da Chapada Diamantina, o agraciou com as seguintes
premiações: 2001, Reconhecimento do Serviço Geológico do Brasil pela excelência
do trabalho Mapa Geológico do Brasil, escala 1:2.500.000, Serviço Geológico do
Brasil – CPRM; 2003, Placa em reconhecimento aos serviços prestados no campo da
Geologia e Sedimentologia do Precambriano, Associação Baiana de Geólogos,
CREA-BA, SENGE-Sindicato dos Engenheiros da Bahia; 2003, Medalha de Ouro
Orville A. Derby, Sociedade Brasileira de Geologia; 2011, Medalha Theodoro
Sampaio, Sociedade Brasileira de Geologia - Núcleo da Bahia-Sergipe.
Certamente que Gugu ficará eternizado
na história da Geologia pelo conjunto de sua obra. Entretanto, para aqueles que
tiveram o privilégio do seu convívio, a memória da sua obra será acrescida pela
recordação das suas citações bem humoradas. O humor, sem dúvida uma de suas
características mais marcantes, fez com que logo após sua partida, alguns
colegas (Pedrosa Soares, Ivo Dussin, Paulo de Tarso, Luiz Carlos da Silva e
tantos outros) enviassem mensagens lembrando algumas de suas frases e citações,
das quais escolhemos algumas:
1996 - Excursão do Congresso Brasileiro
de Geologia, Bacia do Rio Pardo e Faixa Araçuaí, diques máficos
de Olivença... Pedreira logo toma lugar no buteco da
praia... Pedrosa , essas coisas ígneas são muito calientes
pro meu gosto... Vou tabaquear e tomar uma beer,enquanto você mostra
o outcrop pro pessoal.
14 anos atrás, no Bar da Pirâmide, em
Morro do Chapéu, comentou os já muitos casamentos de dois amigos da
UFMG: O primeiro casamento é o triunfo da paixão sobre a razão; O segundo
casamento é o triunfo da esperança sobre a experiência; O terceiro casamento é
o triunfo da boçalidade sobre a inteligência... Eleve ao cubo se for com a
mesma mulher!
Diante da grande quantidade de nomes de
unidades estratigráficas, relembrava sempre: A nomenclatura estratigráfica
é o triunfo da semântica sobre o bom senso!
Sobre o emaranhado de datações e
citações geocronológicas, costumava dizer: “Esse pessoal só se preocupa
hoje em dia com aniversário de rocha"
Luizão conta que ao ser apresentado a
ele pelo Juracy Mascarenhas e ao ficar sabendo que ele era de Santo
Amaro, caiu na besteira de dizer "Então você é da terra do
Caetano?" ao que ele prontamente retrucou: Não, o
Caetano é que é da minha terra, pois cheguei lá antes dele.
Uma noite em Rio de Contas, rodeado de
atentos estudantes da UFMG, resolveu contar como foi seu infarto: Fui
convocado pelo Divino. Levei roupa de anjo e uma harpinha pra tocar na
orquestra do céu... Me dispensaram na última hora!
Congresso Brasileiro de Geologia em
Aracaju, 2006. Gugu, membro da Comissão organizadora ouve de uma colega (também
da Comissão) queixas de cansaço e dores no corpo ao acordar e faz a seguinte
observação: Minha coleguinha, quem já passou dos 50 e acorda sem sentir
dor em lugar nenhum, é porque acordou morto.
É por tudo isso que o Serviço Geológico
do Brasil (CPRM), ou simplesmente a CP como Augusto carinhosamente chamava,
sente-se extremamente honrada em tê-lo tido em seu quadro profissional, em ter contado com seu
empenho e seu talento, abrilhantando os nossos trabalhos, com sua generosidade
disseminando seu conhecimento aos novos.
Nosso eterno agradecimento ao geólogo e
colega Augusto Pedreira e nosso eterno pesar e saudades por sua partida
precoce.
Que Deus conforte sua
família.
Diretoria Executiva
da CPRM
Superintendentes e
Chefes de Residências